Reflexões que Guimarães Tece

 No governo da polis o empurrar com a barriga para a frente, intencionalmente ou quando não se quer ver, normalmente e num certo porvir mais ou menos próximo, comporta custos desmesuradamente acrescidos e que, se o problema que se transfere para um depois tivesse sido encarado a seu tempo (por melhores que tenham sido as intenções que motivaram esse desfasamento), não iriam onerar gerações futuras com encargos que, alguns, podem ser de muito difícil reparação e, sempre, tremendamente injustos para elas.

Afirmação que assim descontextualizada pode parecer muito drástica, mas que contém em si uma realidade que começa a ser difícil escamotear.
Aliás, temos já pela frente uma situação destas para resolver: a da rotunda de Silvares.

Como alguns sabem e foi algumas vezes aflorado, a ligação da A7 a Guimarães estava inicialmente projectada para um basto espaço aonde a actual, apenas parcialmente, ocorre. Aí, segundo as boas regras da arte e através de um enorme trevo, far-se-ia a distribuição do todo o tráfego local e de atravessamento. Como se imporia às portas de uma cidade que se queira condigna. E na sequência estava previsto que a depois A11 contornaria a nossa malha urbana pelo norte. Nesse sentido, já projectada e cadastrada a zona, começaram in­clusivamente os con­tactos com os proprietário dos terrenos. Só que, a dada altura, inopinadamente, tudo se alterou e surgiu a ligação a Serzedelo/Pevidém e aquela aber­rante coisa que é a por­ta de Silvares; e anos volvidos aquelas coisitas para a A11 e saída sul de Guimarães. Tudo decidido nos gabinetes, sem a discussão pública exigível e sem que nunca tenha sido explicado o porquê da alteração, nem a autoria do dislate, ou o que o motivou. Bem como a feitura daquela parva rotunda que, pronto, tu­do o indicava, iria ser anacrónica; como, aliás, foi várias vezes denunciado. Num tudo de, mais uma vez, os maus fados (chame-o cada qual como quiser) que, de há muito e objectivamente pairam sobre este País, terem facultado a subestimação de um ponderado pla­nea­mento consistente e optado por um arremedeio de circunstância de cur­tíssima duração.
Mas, deixemos a lem­brança e centremo-nos no que se quer abordar.
Assim, por meados da década de sessenta, Fernando Távora fez uma palestra na SMS em que, a par da desvirtuação da arquitectura que então começava a emergir pelo repatriamento das poupanças dos emigrantes (numa espécie de antítese do regresso de filhos pródigos), chamava a atenção para a necessidade de se procurar proporcionar, a par da qualidade e sua maior preocupação então expressada, terrenos para construção devidamente infraestruturados. Sem que fosse ouvida a sua avisada voz, chegou-se ao 25 de Abril e no que se seguiu (a azáfama de melhorar e abrir acessos por essas freguesias rurais fora; e na concomitante cada vez mais premente ausência de solos indigitados para construção, e para tal devidamente preparados), vingou a crescente pressão para levantar edificações aqui e ali, um pouco ao sabor de quem ia descortinando, e criando, essa fonte antes insuspeita de réditos inesperados para terrenos não urbanos, por mor de quem intentava comprar barato. E foi o ver se te avias génese do que desmesuradamente temos. E quando se esboçou uma tentativa de pôr alguma ordem no que estava a acontecer, e a agravar-se, foi impossível concretizar um verdadeiro consenso real nesse sentido e até, pronto e logo a seguir, por novas orientações, foi esse propósito desfeiteado com o fomento intencionado da pulverização.
A crer-se no dito, há um ponto que urge trazer à colação. Até porque, parece, tem sido sistematicamente ensombrado. Assim e pondo de parte quaisquer questões de ordenamento (que, portanto, se dão por excluídas para este efeito), ocorre perguntar quem irá suportar os custos de infraestruturas inexistentes, capazes, ou as melhorias quan­do as presentes sejam manifestamente insu­ficientes, ou impró­prias, para a vivência hodierna exigível por essa miríade de construções (habitacionais, industriais e de toda a natureza, em que se podem incluir alguns equi­pamentos)? Para as de foro concessionado não se pôs, nem se põe, essa interrogação, porque a resposta é por demais sabida: quem as quer, paga-as. Sem esquecer, entretanto e ainda, as despesas com a manutenção de extensões nascidas não de uma pers­pectiva orientada de expansão, mas ao sabor de vontades individuais e quase ao deus dará. Isto com resultados já evidenciados no que se está a passar com os transportes públicos; no desaproveitamento do que poderíamos chamar economias de escala; na acrescida dificuldade para uma constante modernização tecnológica para melhor qualidade, etc. etc. . E já para não aditar as de uma gestão mais exigente e volumosa, dada a amplitude espacial do que devia, e podia, ser muito mais reduzido face ao número efectivo dos seus utentes. Utentes estes que, vivaços, tendo escolhido, e conseguido, implantar as suas construções aonde pretendiam e nos sítios mais desguarnecidos, agora, por vezes, vociferam por aquilo que, desde sempre, sabiam não existir lá e a que se arrogam veementemente com direito. Como se tivessem edificado em áreas destinadas a esses usos.
O que se pergunta, portanto, é sobre quem recaíram ou vão recair todos esses desembolsos?
Sobre o , claro; como sempre investido no papel de mexilhão de opções sem pernas para andar.

Óscar Jordão Pires
Fundevila, 14 de Março de 2018


terça, 20 março 2018 21:34 em Opinião

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