Convicções

“Convicção é a crença de estar, em algum ponto do conhecimento, de posse da verdade absoluta. Esta crença pressupõe, então, que existam verdades absolutas (...).”
Friedrich Nietzshe. Humano, demasiado humano. 1878/1886.
Vivemos tempos em que toda a gente tem fortes convicções. Faz parte do pacote do opinante apresentar publicamente as suas inabaláveis convicções. Eu, com a idade, vou-as perdendo. Sem particular pena, diga-se. Em termos ideológicos, na avaliação de personalidades, em questões de ordem moral – apesar da minha forte costela liberal-, tenho hoje mais dúvidas que certezas, e isso não me angustia, pelo contrário dá-me a bovina tranquilidade da não certeza. Viver obcecado nas convicções é meio caminho andando para a imobilidade das trincheiras ... morais, políticas, filosóficas.
Tenho, mesmo assim, algumas convicções ina­­baláveis: a exata quantidade de sal grosso que o camarão da costa acabado de cozer deve levar, que os sopradores de folhas deveriam ser proibidos, que nunca dançarei zumba, e que Sócrates é a vergonha do Portugal político não pelo que ele fez, mas pelo que se calou enquanto ele o fazia.
E mesmo tendo em conta que as convicções me irritam – ou talvez por isso – deixo mais algumas...
Isto não está nada bem. Não me lembro das gran­des potências mundiais terem dois loucos – simultaneamente - ao leme. Para um Reagan existiu um sensato Gorbatchev, para um Ieltsin existiu um comunicativo Clinton. Agora para o fanfarrão Trump existe outro fanfarrão: Putin e em tronco nu. Até o presidente da fechada China parece um senhor ao lado destas peças. Era aqui que a Europa deveria entrar, como garante de democracia e sensatez. E há gente boa a liderar esta Europa que perde dia a dia a sua oportunidade de ser um sólido farol do mundo democrático e económico, porque não se entende enquanto comunidade, porque o populismo e o separatismo vão consumindo a Espanha, a Itália, a Bélgica, o Reino Unido que se apartou, porque o populismo, a censura e a intolerância vão moldando a Polónia, a Hungria. Quando o mundo mais precisava de nós não estamos prontos, estamos com as calças na mão e isso é uma pena para a Europa e para o Mundo.
Estou convicto aliás que o populismo é a maior das pragas atuais que se agiganta hoje devido à facilidade com que a mentira é divulgada diariamente nas redes sociais, ao desinteresse generalizado das popu­lações pela imprensa e à facilidade com que se geram convicções. Aliás o populismo é um fazedor nato de convicções de pacotilha. Numa en­tre­vista recente Tony Blair refere que o forte fenómeno do populismo se alimenta da raiva das pessoas, sem nunca oferecer soluções para os problemas reais do coletivo. E é isso mesmo: o populismo é um cão raivoso que trinca qualquer um, que mina, que destrói, só porque somos de uma origem diferente, temos um pensamento diverso, no fundo só porque sim, nem que em troca não haja nada, mesmo nada. Só a raiva e o ódio que, diga-se, não nos fazem falta nenhuma.
Valha-nos o mun­dial de fu­tebol agora para distrair, já que o nosso campeonato é a vergonha que se conhece. A insanidade do Bruno ainda distrai, mas o resto da escandaleira é demasiadamente grotesca para não nos meter nojo, a todos. Os campos vão continuaram inclinados contra o nosso Vitória e os outros como nós, como sempre estiveram aliás. Pelo menos, por aí, não haverá novidade que nos surpreenda.
É por isso sempre refrescante ter na próxima época um treinador como o Luís Castro. Alguém que fala em vez de voci­ferar, alguém que se apresenta com um trato pouco usual no meio em que se move e que, julgo, percebe de futebol e da sua organização.
Estou com es­perança que as coisas corram bem ao nosso Vitória e que, nem que por momentos, consigamos ludibriar todas as armadilhas que nos vão colocar. E se a essa esperança juntarmos a nossa paciência coletiva (aqui já tenho dúvidas...) então estarei convicto que vamos, no Vitória, ser felizes. Como merecemos aliás.
 
Rui Vítor Costa

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