A revisão da história

O assassinato do norte americano George Floyd no passado dia 25 de Maio pelo polícia Dereck Chauvin no estado do Minnesota dos EUA

constituiu mais um episódio que põe a nu o forte sentimento racista presente ainda nos Estados Unidos, assim como a brutalidade com que habitualmente actuam as suas forças policiais.

As imagens da asfixia do homem sob a pressão do joelho do polícia deixaram o mundo inteiro horrorizado com tamanha brutalidade despoletando, de imediato, manifestações de profundo repúdio em praticamente todas as grandes cidades do mundo.

A luta contra o racismo, doença, infelizmente, presente na generalidade das comunidades do mundo inteiro, tem assumido, ao longo dos tempos, uma maior visibilidade nos Estados Unidos da América, seja pela presença maciça de africanos descendentes dos escravos para lá levados por colonizadores para alimentar a produção agrícola dos estados do sul, seja, sobretudo, por ser uma democracia com liberdade de manifestação e ter uma forte e independente comunicação social.

Assumiu maior relevância e visibilidade na segunda metade do século XX com a luta pela conquista dos direitos dos negros promovida por Martin Luther King nos Estados Unidos América, e por Nelson Mandela, contra o apartheid, na África do Sul.

É uma luta contínua que não se deve limitar à segregação social decorrente da côr da pele, mas a todas as atitudes que ponham em causa os direitos das pessoas por razões de índole social, política, religiosa, desportiva, de género, etc.

É, claramente, um passo importante na libertação do homem e no reconhecimento da igualdade de direitos consagrada na Declaração Universal dos Direitos do Homem, fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo

As manifestações que temos vindo assistir nas principais cidades dos quatro cantos do globo traduzem a repulsa que tais sentimentos merecem à opinião pública dos tempos actuais. Pena são, no entanto, os excessos cometidos em algumas dessas manifestações, que se têm traduzido por actos de vandalismo em monumentos que assinalam marcos históricos na vida dos povos e das nações e que só por ignorância, ou tentativa de reescrever a história, se poderão compreender.

Na verdade, ver a estátua de Cristóvão Colombo, o navegador responsável pela “descoberta da América”, decapitada em Boston; ver a estátua de Winston Churchill, o símbolo da democracia, vandalizada em Londres, e agora, vandalizada também em Lisboa, a estátua de um dos maiores vultos da cultura portuguesa e lutador pelos direitos dos oprimidos, o padre António Vieira, acusados de conluio com o comércio de escravos, não pode merecer outra coisa que não seja repúdio veemente.

Com estes excessos e atitudes não poderão deixar de ser co-responsabilizados os pseudo-historiadores do presente que tentam reescrever a história à luz dos tempos de hoje, apagando factos e autores que ponham em causa valores que hoje, praticamente, todos defendemos.

A história de um povo regista factos e acontecimentos que muito orgulham uns, e de outros que envergonham. Mas todos eles tiveram o seu enquadramento histórico e social e contribuíram para a construção daquilo que somos hoje.

A expulsão dos Judeus de Portugal por D. Manuel II em 1496, seguindo semelhante atitude de seus parentes, os reis católicos; a instalação da Inquisição (Tribunal do Santo Ofício) em 1536, verdadeiro instrumento de perseguição ao serviço do poder, com um sem número de crimes cometidos; as perseguições contra os poderes económicos e sociais levadas a cabo por Sebastião José de Carvalho e Melo – Marquês de Pombal -, constituem alguns dos tristes exemplos da nossa história que muito nos envergonham, mas que não poderão nem deverão ser, de modo algum, esquecidos.

Saibamos compreender a importância de manter viva a nossa história na sua plenitude e que o conhecimento dos maus acontecimentos do passado nos sirvam de lição para a construção de um futuro melhor.

Guimarães,16 de Junho de 2020
António Monteiro de Castro

quarta, 17 junho 2020 16:16 em Opinião

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