Atractividade das cidades



Referi-me no artigo anteriormente publicado neste mesmo espaço, à queda da população que Guimarães tem vindo a registar ao longo

das últimas duas décadas e ao alerta que constituiu o registo, pela primeira vez em décadas, de um saldo natural negativo no passado ano de 2019, isto é, de ter havido um número de óbitos superior ao número de nascimentos.

Tentei realçar a importância da forte correlação existente entre demografia e desenvolvimento económico.

Terminei, sugerindo a realização de um estudo demográfico e sociológico que traga luz sobre as medidas a adoptar com vista à correcção desta endémica situação de queda de população que tanto aflige o nosso concelho.

Hoje evoco dois acontecimentos ocorridos em Lisboa e em Matosinhos que constituem um contributo para o aumento da atractividade dessas duas cidades, factor importante na fixação e captação de população.

Foi notícia no jornal Público do passado dia 5 de Setembro, a doação à Câmara Municipal de Lisboa da biblioteca particular do escritor e bibliófilo Alberto Manguel.

Ex director da Biblioteca Nacional da Argentina e leitor de livros a Jorge Luís Borges no seu período de cegueira, este cosmopolita Canadiano-Argentino trocou Nova Iorque por Lisboa concedendo a essa Câmara Municipal os mais de 40.000 volumes da sua biblioteca a qual conta com vários livros raros que irão constituir o principal atractivo do futuro “Centro de Estudos da História da Leitura” que será por si mesmo dirigido e que conta com nomes sonantes para integrar o seu Conselho Honorário como Salman Rushdie, Margarete Atwood, Chico Buarque e Tolentino de Mendonça.

Está, pois, de parabéns, o presidente da Câmara de Lisboa Fernando Medina e a vereadora da cultura Catarina Vaz Pinto que, estando atentos, conseguiram dotar Lisboa com mais um importante equipamento promotor de atractividade que as cidades, nos tempos atuais, tanto desejam.

Também no mesmo jornal Público, na sua edição do passado dia 10 de Setembro, foi notícia a doação da totalidade do acervo profissional do arquitecto brasileiro Paulo Mendes da Rocha, vencedor do famoso prémio de arquitetura Pritzker e autor do projeto do Museu dos Coches à Casa de Arquitetura de Matosinhos.

Trata-se de um conjunto de cerca de 880 itens respeitantes a mais de 320 projetos constituídos por 630 desenhos analógicos, 1300 desenhos físicos, 3000 fotografias e slides, um conjunto de maquetes e 300 publicações.

A notícia destas duas doações constitui, por si só, motivo suficiente para destaque no panorama da comunicação social, seja não só pela a razão do seu contributo para tornar essas duas cidades mais atractivas e competitivas na disputa de população, sobretudo da mais exigente e qualificada que tanto interessa às comunidades, seja sobretudo pelo exemplo que podem constituir para outros gestos generosos semelhantes.

No passado, as principais instituições, sobretudo as de beneficência, de solidariedade e religiosas, foram sendo alimentadas ao longo dos tempos por gestos de grande generosidade, coisa cada vez mais rara nos tempos actuais.

É verdade que qualquer um destes dois acontecimentos ocorridos em Lisboa e Matosinhos não foram fruto do acaso. Significaram, seguramente, uma atenção e um consistente empenho, apoiados em decisões inteligentes tomadas no passado. Lisboa tinha, na sua carteira patrimonial, o “Palacete dos Marqueses de Pombal” e Matosinhos tinha a “Casa da Arquitetura”, equipamentos decisivos na captação destas duas doações.

Guimarães e as suas instituições assistiram também a muitos gestos de doações que permitiram a muitas delas serem o que hoje são. Colegiada da Oliveira, Santa Casa da Misericórdia, Ordem de S. Francisco, Ordem de S. Domingos, Irmandade dos Santos Passos e tantas outras, ostentam nas suas paredes pinturas de grandes beneméritos do passado.

No âmbito de instituições culturais destaca-se a Sociedade Martins Sarmento, fruto da grande generosidade e inteligência do sábio e investigador Francisco Martins Sarmento, assim como de uma nata de ilustres vimaranenses seus contemporâneos que souberam pôr de pé uma instituição que ao longo dos últimos quase 140 anos promoveu a formação e a cultura ontribuindo para a afirmação de Guimarães como importante centro económico e empresarial do país.

Saiba, pois, o nosso município estar preparado, tal como esteve quando foi necessário captar o Tribunal da Relação, tendo disponível a “Casa dos Coutos”, outrora residência de D. José de Bragança, arcebispo de Braga.

Esteja para isso atento e exerça o direito de opção nas transações que envolvam edifícios históricos da cidade, preparando assim decisões futuras, como aconteceu nos casos referidos.

A “Casa dos Lobo Machado”, por exemplo, ex-sede da Associação Comercial Industrial de Guimarães – ACIG, com a carga histórica que transporta, sua qualidade arquitectónica, dimensão e localização, bem merecia essa mesma atenção do nosso município.

Saibamos hoje preparar o futuro de amanhã.

Guimarães,
22 de Setembro de 2020
António Monteiro
de Castro

terça, 22 setembro 2020 14:24 em Opinião

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