A propósito das eleições presenciais

A presente campanha presidencial tem suscitado um elevado interesse e será bom que venha a traduzir-se em idêntica

motivação dos eleitores para exercerem o seu direito de voto.

Esse interesse resultará, estou em crer, não tanto do número de candidatos quanto da originalidade decorrente das candidaturas oriundas de partidos de recente formação, como são o caso das lançadas pelo Iniciativa Liberal e pelo Chega, da candidatura de Ana Gomes, com longo percurso político nomeadamente no Partido Socialista, de que foi quadro de topo, e com credenciais de respeito, como a de ser embaixadora de carreira, com notáveis provas dadas enquanto chefe da missão diplomática portuguesa e Embaixadora de Portugal na Indonésia no difícil período em que ocorreu a independência de Timor Leste, e a de ter sido deputada ao Parlamento Europeu durante 10 anos, relevando a sua ligação ao partido Socialista que, enquanto tal. a não apoia, assim como não apoia qualquer candidato, mas no qual a candidata conta com significativos apoios individuais, alguns de peso, e da já quase imprescindível candidatura de Vitorino Silva, que se tornou conhecido como Tino de Rãs aquando uma curiosíssima intervenção, qua testemunhei ao vivo, durante o 11º Congresso do Partido Socialista.
Restringida que ficou a campanha eleitoral às entrevistas aos candidatos e aos debates em que intervieram, àquelas e a estes dediquei o quanto baste da minha atenção, que não pecou por excesso nem por defeito. A curiosidade, porém, foi muita, dada a disparidade de formação pessoal e política, de ideologias e idiossincrasias entre os candidatos e candidatas e, fazendo apelo à maior isenção de que sou capaz (sem que isso signifique não ter já decidido o meu voto) do que vi e ouvi colho as seguintes impressões a que só chamo de gerais por abarcarem todos os debates e todos os candidatos:

Começo por manifestar a minha indignação, não apenas e nem tanto pela grosseria e agressividade da generalidade dos entrevistadores, alguns de quem jamais esperaria tal modo de atuar, que se mostraram ou acefalamente obedientes instruções superiores, ou do mesmo modo acéfalo adeptos das piores modas de condução de entrevistas, ou simplesmente ignorantes das mais elementares regras de cortesia e educação.
Não: a minha indignação verte-se principalmente sobre todos os entrevistados a sós ou em debate, que, uns mais outros menos, mas todos muito, não souberam dar-se ao respeito que a todos seria devido, deixando-se, fosse por medo, cobardia, pusilanimidade, chame-se-lhe o que se quiser, desfeitear e desrespeitar perante todos quantos se interessaram em estar atentos às suas prestações. Faltou o murro na mesa como aquele que Mário Soares deu a Margarida Marante mal esta, entrevistando-o, começou a comportar-se como o fizeram os moderadores de agora.

Concomitantemente reparei que da plêiade de comentadores que professoralmente peroraram sobre cada entrevista ou debate imediatamente após o seu termo, interessadíssimos em catar sobretudo as pastes más de cada prestação, nem um comentou a conduta dos entrevistadores, como se “aquilo” fosse exatamente comoo que devia ser.
Não sei se os comentadores foram pagos; mas se não foram, é uma injustiça!...

Fiquei pasmado por nenhum dos candidatos que afirmaram vir a ser, se eleitos, presidentes de todos os portugueses, ter explicado a quem afirmou que o não seria, o que é ser presidente de todos os portugueses e o quão criminoso é não o ser.
Ser presidente de todos os portugueses não impede promover a repressão do crime, da desonestidade laboral e social, encarcerando quem pelos seus atos merece ser preso, punindo quem trapaceia para indevidamente auferir benefícios, quem burla o próximo ou o Estado.
Ser presidente de todos os portugueses é proporcionar a todos, criminosos ou cidadãos exemplares, trabalhadores ou preguiçosos, ricos ou pobres, etc, etc, tratamento em caso de doença, promovendo a assistência pronta e devida tanto ao pacato cidadão que na rua ou em sua casa sobre um enfarte, como ao assassino que em reclusão o sofre.
É determinar que seja prestado socorro pronto a quem está a ser objeto de violência, independentemente de quem seja a vítima, ainda que em reclusão devido á prática de delito grave. É usar de todos os meios ao dispor para que ninguém que cometa um crime fique impune e ninguém que de crime seja vítima deixe de receber o apoio e reparação que lhe são devidos; sejam eles quem forem, tanto autores como vítimas, etnicamente europeus, árabes, judeus, magrebinos, africanos, ciganos, asiáticos, orientais, nórdicos ou austrais.
Ser presidente de todos os portugueses é usar dos poderes presidenciais para que as leis sejam aplicadas por igual a todos os homens e a todas as mulheres a quem elas se destinam, conferindo-lhes direitos e deveres, a todos e todas permitindo beneficiar dos primeiros e compelindo a cumprir os segundos, sancionando-os com proporcionalidade quando os não cumpram.
Não ser presidente de todos os portugueses é considerar equivalentes a meras coisas, aqueles e aquelas de quem se não é. Mate-se um cigano, viole-se uma refugiada, esfaqueie-se um presidiário? Pouco importa, não sou presidente deles …

Admirou-me que, à afirmação malevolamente demagógica de que, com o confinamento por causa da pandemia, o governo soltara os criminosos que estavam presos e tenha prendido os portugueses honestos em casa, nenhum dos candidatos a quem tal foi afirmado tenha respondido não ser isso verdade. Os que foram soltos da cadeia ficaram sujeitos precisamente ao mesmo regime que o resto da população: confinamento em casa.

Não compreendo porque não impõem os nossos canais de televisão regras semelhantes às que foram determinadas pelo canal americano que difundiu o segundo debate de Trump com Biden, que, olhando a trapalhada em que caiu o primeiro, com os protagonistas a falarem ao mesmo tempo durante quase todo o tempo, regras aquelas segundo as quais os candidatos dispunham, alternadamente, de determinado tempo para falar, sem interrupção, sob pena de corte imediato do microfone àquele que desrespeitasse o estabelecido.

Finalmente, porque mal me sentiria se o não fizesse, dou parte da minha decisão quanto ao voto.
Votarei Marcelo Rebelo de Sousa. Pelo que pessoalmente dele conheço e pelo que dele se pode concluir enquanto comentador televisivo, há sempre em mim uma bolsa de desconfiança quanto à pessoa. Porém, olhando a sensatez com que exerceu o primeiro mandato e as circunstâncias sociais e políticas que se vivem e viverão ainda não se sabe até quando, com uma pandemia esmagadora, por causa dela com uma economia em estado próximo do sufoco, e com uma situação política a carecer de um denso elemento estabilizador, olhando o elenco de candidatos que se nos apresenta, Marcelo Rebelo de Sousa é para mim, sem dúvidas nem estados de alma, o mais adequado para o Portugal em que estamos e tendo em conta os tempos que se avizinham.

Guimarães, 19 de janeiro de 2021
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