Portugal tem 50 mil sobredotados

São crianças especiais, sentem-se diferentes dos outros meninos das suas idades, mas têm os mesmos sonhos e os mesmos projectos. Em vez dos carrinhos e das bonecas, brincam com livros e jogos didácticos, em vez das corridas de bicicleta e do jogo do esconde-esconde, optam por aprofundar os conhecimentos num computador, de preferência ligado à Internet. É assim o mundo das crianças sobredotadas, nem sempre fácil de viver. Porque os pais estão apenas preparados para responder ao básico do dia-a-dia e porque as escolas não têm capacidade para dar uma atenção redobrada a estas crianças especiais. A Rádio Santiago partiu à descoberta deste mundo diferente, banhado com as cores do arco-íris. Porque é assim que estes meninos o vêem. Multicolor, nem sempre justo, mas repleto de tesouros para descobrir. José Pedro Rodrigues frequenta o 7º ano da Escola Bernardino Machado, em Joane, Famalicão. Nasceu em Guimarães, na freguesia de Ronfe, há 11 anos, mas, recentemente, transitou de malas e bagagens para Pousada de Saramagos. Vive com os pais e mais dois irmãos, mais novos. Por isso, nem sempre é fácil arranjar companhia para partilhar aquilo que gosta de fazer. Já leu todos os livros de Harry Potter, porque a fantasia agrada-lhe e como qualquer criança da sua idade também tem uma paixão especial pelo futebol. Agarra as cores de dois clubes portugueses, mas não sonha tornar-se um Luís Figo, como desejam
milhares de meninos de todo o mundo. Porque o futebol não lhe povoa o imaginário, até porque tem pouco para descobrir. Os seus voos vão muito mais além, até novos continentes e galáxias. José Pedro recebeu a reportagem da Rádio Santiago com um brilhosinho nos olhos,
típico de quem vai ser notícia. Não é que tenha sido uma novidade, uma vez que falar para um gravador não lhe provoca calafrios. Por isso, desatamos a conversar sobre tudo: os seus passatempos, a guerra no Iraque e o seu futuro profissional.
José Pedro sabe que é uma criança diferente. Com um Quociente de Inteligência acima da média, aos quatro anos de idade já lia um jornal do princípio ao fim. Sempre munido de um dicionário, para poder interpretar correctamente um texto e para descobrir novas palavras.
Porque a vida é mesmo assim: um poço de descobrimentos que José Pedro quer aprofundar. Como qualquer criança da sua idade, José Pedro também vê banda desenhada, séries e filmes. Especialmente se falarem de história que abranja o Egipto. Porque é esse o país que o fascina e porque é esse o país que quer visitar. É que se os meninos da sua idade sonham conhecer a Disneylândia ou a Disneyworld, para contactar com a Minie, o Mickey ou o Pateta, José Pedro prefere entrar dentro de uma esfinge e conhecer o passado de um Faraó.
Não são sonhos fáceis de concretizar, principalmente para uma família menos abastada como a sua.
António Rodigues, pai de José Pedro, sente-se triste por não poder acompanhar, como gostava, o seu filho. Porque tem mais dois filhos para criar e porque os dois salários mínimos que sustentam a casa não chegam para custear gastos supérfluos. Gastos com livros de história e do espaço, gastos com um computador ligado à Internet ou mesmo com uma viagem ao Egipto. António Rodrigues soube que o filho tinha aptidões acima da média há sete anos atrás. É que Pedro, aos quatro anos de idade, já sabia ler um jornal. Por isso foi para a escola aos cinco e fez a terceira e a quarta classes no mesmo ano. Um dos sonhos de José Pedro era conhecer o Visionarium. A Rádio Santiago proporcionou-lhe um dia diferente no Centro de Ciência do Europarque de Sta Maria da Feira. Sempre atento a tudo o que via e ouvia, José Pedro ia fazendo perguntas sobre as odisseias que ía descobrindo: pimeiro a odisseia da terra, depois a do universo, da informação, da matéria e da vida. Durante mais de quatro horas, José Pedro tornou-se num visioactivo. Ficou a conhecer a orientação cartográfica, observou o universo, a terra, a lua e o sol até ao infinito. Depois, entrou dentro de um computador, de uma caravela e deu a volta ao mundo. Ficou a
conhecer a diferença entre um atómo, a máteria e a luz, experimentou novos cheiros, tocou objectos, até agora desconhecidos, vibrou na sala multisensorial. Afinal, o Visionarium, de Sta Maria da Feira, é muito mais que aquilo que esperava. No final da visita, foi peremptório: é obrigatório voltar. Porque há muito mais para ver no Centro de Ciência do Europarque.
Como José Pedro, existem cerca de 50 mil crianças sobredotadas em Portugal. A maioria delas não foi identificada, o que indicia a negligência de que são alvo, sobretudo por falta de informação. Sem apoio na escola nem compreensão em casa, as crianças são as maiores
prejudicadas.

Marcações: Sociedade

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