Viva o 25 de Abril



Comemora- se na próxima semana o quinquagésimo aniversário do 25 de Abril, uma das mais importantes datas da história recente de Portugal,

um marco histórico do século XX.Comemora- se na próxima semana o quinquagésimo aniversário do 25 de Abril, uma das mais importantes datas da história recente de Portugal, um marco histórico do século XX.

Em tempo de guerra na Europa e suas fronteiras, e de ameaças crescentes à democracia face ao aparecimento de partidos populistas e de autocratassedentos de poder, impõe-se que esta data, de meio século sobre a implantação da Democracia, seja comemorada com grande dignidade e profusão entre todos os portugueses.

É justo lembrar que foi sobretudo graças à bravura e arrojo de um destemido grupo de militares, apoiado depois por um povo sedento de liberdade que vimos ser posto fim a um regime ditatorial de quase cinco décadas e podermos assim comemorar este meio século do nascimento da nossa Democracia.

Para avaliar a importância do acontecimento histórico, convirá lembrar um pouco o que era a realidade portuguesa no período pré 25 de Abril. Recorda-se, assim, a ameaça da ida para a Guerra colonial, situação incompreensível e contra a corrente da história que arrastava Portugal, pelas piores razões, para as primeiras páginas da imprensa mundial e das organizações internacionais.

Recorda-se também o que eram as dificuldades da vida, nomeadamente as dos mais pobres, para os quais frigorífico, televisão ou até mesmo energia eléctrica ou água canalizada eram luxos proibidos, sendo mesmo a alimentação limitada à sobrevivência, facto facilmente comprovável ao observar a compleição física das pessoas nas imagens televisivas daqueles tempos.
Quanto à formação escolar, o analfabetismo atingia 25 % da população sendo o ensino secundário e o superior reservado para uns tantos privilegiados. Portugal tinha parado no tempo. Vivia-se a política do “orgulhosamente sós”.

As elites do poder, protegidas por um regime musculado, pouco ou nada se manifestavam tolerantes com as ideias emergentes na nova europa que progressivamente saía da destruição e do caos - a que tinha sido conduzida pelas grandes guerras de 1914/1918 e de 1939/1945, - apoiada sobretudo pelo Plano Marshall e, mais tarde, pela grande visão dos seus líderes Konrad Adenauer, Jean Monnet, Robert Schuman e Alcide de Gasperi fundando, em 1951, a CECA – Comunidade do Carvão e do Aço, percursora da actual União Europeia.

Tal fechamento político, social, cultural e económico do regime, havia empurrado o país para a estagnação, apenas abanado pela entrada na Organização do Tratado do Atlântico Norte – NATO em 1949 e, mais tarde, em 1960 na EFTA, promotora do comércio livre e integração económica, altura a partir da qual se sentiu um brusco crescimento económico resultante do importante incremento do sector produtivo industrial.

Com o rebentamento da guerra do Yom Kipur em 1973, era chegada a primeira crise do petróleo, fazendo aparecer um fenómeno novo, até aí pouco conhecido, denominado inflação que viria a perturbar profundamente a economia da época.Juntamente com a alteração da situação económica, coexistia um profundo descontentamento da juventude com a guerra colonial face às consequências ao nível de mortos e estropiados de guerra, começando a tornar-se evidentes sinais de descontentamento em vários sectores da sociedade portuguesa nomeadamente estudantes, intelectuais, trabalhadores e militares.

Eram os tempos conturbados da publicação do livro “Portugal e o Futuro” do general António Spínola, em Fevereiro de 1974, que deixava transparecer o grande descontentamento que grassava nas forças armadas em consequência do modo como estava a ser conduzida a guerra no ultramar para a qual defendia solução política e não militar.

No mês seguinte, a 16 de Março, dá-se o levantamento das Caldas sustido à entrada de Lisboa com a prisão das duas centenas de militares que o compunham, confirmando o profundo descontentamento militar.

Depois, foi o triste espectáculo da manifestação de fidelidade e lealdade ao regime na pessoa do Presidente do Conselho, professor Marcello Caetano, pelos Oficiais superiores e Generais, conhecido pela “Brigada do Reumático” que, se dúvidas houvesse, anunciava e confirmava ter chegado ao fim o regime.

Uns dias depois, na madrugada do dia 25 de Abril do mesmo ano de 1974, estavam de novo os militares na rua, agora acompanhados por uma multidão que a eles se juntava impedindo qualquer tipo de reacção por parte das forças ainda leais ao regime.

Foi o momento da grande explosão social com as ruas apinhadas de gente, multidões gritando e chorando de alegria. Parecia chegado o momento da realização dos grandes sonhos ao longo dos tempos recalcados. Era chegado o tempo dos três dês – Democracia, Descolonização e Desenvolvimento.

Por todo o lado, toda a gente queria participar na transformação do seu país numa terra nova. Era o tempo das comissões: comissões de moradores, comissões de trabalhadores, comissões de sargentos e praças, comissões de tudo.

Foi o tempo do aparecimento à luz do dia dos partidos já existentes na clandestinidade, como o Parido Comunista, ou o Parido Socialista e do nascimento de muitos outros como o PPD – Partido Popular Democrático, ou o CDS – Centro Democrático Social.

Foram difíceis esses primeiros tempos da democracia. Os excessos revolucionários, sempre presentes nas transformações sociais bruscas, coartaram de forma violenta o exercício dos direitos democráticos.

A turbulência social das ruas interagia de modo intenso com a vida interior dos quartéis. A hierarquia militar rapidamente havia de ser tutelada pelo denominado “Conselho da Revolução”. Dele emanavam as leis e a cobertura de muitos dos excessos da revolução durante o período conhecido como PREC - Processo Revolucionário em Curso.

Só mais tarde, em Setembro de 1982 haveria de ser extinto com a primeira revisão da constituição de 1976, para finalmente ficar instaurada a democracia política. A sua consolidação haveria, pois, de vir a ocorrer progressivamente ao longo das últimas quatro décadas.
Entretanto, as conquistas sociais alcançadas foram imensas, seja na área do ensino, da saúde, das prestações sociais, do bem-estar. Portugal, apesar de ver grande parte dos seus principais grupos económicos decepados com os excessos revolucionários conseguiu, com a ajuda dos seus parceiros europeus, dotar-se dos equipamentos e infraestruturas compatíveis com os dos países desenvolvidos.
Entretanto, a Globalização, processo de convergência económica, social e cultural mundial, contendo em si muitas vantagens, nomeadamente no respeitante ao desenvolvimento económico e social de muitos países do terceiro mundo, implicou, por outro lado, uma crescente redução do poder económico das famílias dos países desenvolvidos, acarretando um descontentamento generalizado e profundo de muitos dos seus cidadãos, criando assim terreno propício e vulnerável aos populistas extremistas, os grandes inimigos da Democracia.
São cada vez mais visíveis os sinais de ataque aos regimes democráticos, seja na europa, seja mesmo na grande democracia dos Estados Unidos da América, onde partidos populistas, aproveitando a liberdade das democracias as vão progressivamente corroendo.
Celebremos, pois, com vivacidade, entusiasmo e grande alegria a festa dos cinquenta anos da Democracia em Portugal.Viva o 25 de Abril

Guimarães, 15 de Abril de 2024

António Monteiro de Castro


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